segunda-feira, outubro 29, 2001

MARIA E CAROLINA

Eu não sabia, mas tenho duas filhas.
Uma é Maria, com sua doçura
E cândidas expressões.
Carinhosa, busca o colo como busca alimentar-se,
Pede as coisas com o mais ingênuo dos sorrisos,
E ri com a mais profunda expressão de prazer.
Minha outra filha é Carolina.
Firme, determinada, decidida,
Tem desejos e quer vê-los satisfeitos,
Insiste e chora como se estivesse com fome,
Ignora argumentos como se nada mais existisse,
E responde às perguntas com o mais travesso dos olhares.
Essas duas filhas existem numa só.
Num corpo tão pequeno, perfeito e delicado,
Que nenhum artesão poderia reproduzir,
Com uma beleza tão singela que é impossível ignorar.
Minhas duas filhas entortam o meu saber,
Meus anos de experiência desfazem-se num sorriso,
Meus argumentos, coitados, perderam-se no tempo.
Como as duas estão sempre presentes,
Jamais sei se estou sendo justo ou coerente.
Essas duas filhas, que Deus me deu a graça de ter,
Transformaram-me em dois também,
Um, coitado, perdeu-se no tempo quando nasceram,
O outro, encontrou uma nova graça de ver e de viver.
Quando penso que amo mais a tranqüilidade da Maria,
Sou tomado de alegria pela energia de Carolina.
Se acho que prefiro ser questionado por Carolina,
Sou arrebatado pela ternura de Maria.
Nessa dúvida, nessa dualidade, meu amor se fez dois.
Da paixão que nutro por uma filha,
Surge o impulso para amar a outra em igual intensidade.
Porém, mesmo duplicado, meu amor parece insuficiente,
Porque eu, com todo o meu tamanho e todo o meu conhecimento,
Não sou capaz de produzir, uma fração que seja, o brilho e a intensidade
Que brotam dos seus olhos quando fala papaizinho.
Quisera eu ter tamanho poder de, em tão pequeno ser,
Ser tanto em tão pouco e tão curto tempo.
Sei que ainda vou ter que crescer e multiplicar-me em vários,
Para um dia ser capaz de conter, em mil corpos e mil corações,
Toda a beleza que eu vejo crescer bem diante do meu colchão.

Sem comentários: