domingo, outubro 30, 2005

Yet to Come

Meia noite e dez, madrugada de segunda-feira.
Não é nem a primeira e nem será a última madrugada batucando no teclado do meu note. Até aí, nada demais. Será mesmo?
Eu sempre acreditei que a sua vida você faz primeiro e depois espera para ver se tem algum reembolso. O problema é que não tem. Não? Não. Tempo não tem reembolso.
Sempre me disseram que o dinheiro não compra felicidade. Compra, sim. Porque compra conforto, amigos, cultura, beleza, saúde, amor. Você pode dizer que amigos e amores comprados não são verdadeiros. Bullshit! Quem disse isso não tinha dinheiro. Dizer isso é conformismo. Quantas pessoas têm a sorte de ter amigos verdadeiros, que não buscam algum interesse? Eu tenho. Mas sou uma minoria decrescente. Quantos relacionamentos são verdadeiros, casos de alma gêmea, à prova de privações? Poucos. Eu também tenho essa sorte.
Portanto, esqueça o que te disseram sobre o que o dinheiro não compra. Compra tudo e, se você for bom negociador, compra barato. O que torna mais fácil se desfazer quando gasta.
A única coisa que dinheiro não compra é tempo. Porque o que interessa não é quanto tempo você vive, mas viver cada coisa no seu tempo. 10 anos de realização são infinitamente melhores do que 100 anos de arrependimento. Nunca mais você vai olhar para alguém como fez aos 15 anos, nem vai ficar tão feliz com um presente quanto quando tinha 4 anos. Ninguém consegue ser adolescente aos quarenta e só fica ridículo quando tenta. Ninguém apaga as marcas do que viveu. Você pode apagar as marcas da idade no rosto e no corpo, mas não apaga da mente.
Portanto, não adianta se matar, perder o crescimento dos filhos, postergar os relacionamentos e as amizades para aproveitar mais tarde, quando o dinheiro for abundante. Isso é querer reembolso do que você perdeu e, sinto dizer, isso não vai acontecer. Você vai comer comida fria, tomar cerveja quente, beber café requentado e não vai poder fazer nada. Pode tentar comprar a comida mais cara, a cerveja mais exclusiva, o café mais valioso para tentar compensar, mas o gosto estará horroroso.
Por outro lado, não adianta pensar que o negócio é sair esquecendo do futuro e vivendo o presente. Seize the day, carpe diem e viva o presente são mensagens indecifráveis, ditas por quem, como dizem os ingleses, não está nos seus sapatos, não vive os seus dramas.
Como aproveitar o presente sem dinheiro suficiente sequer para pagar as dívidas que você já fez (imagine, então, as que você faria...)? Como mandar o cliente, os chatos de plantão, as obrigações às favas e curtir as brincadeiras da sua filha? Como aproveitar o almoço em família ou viver uma noite de amor pensando no que você deveria fazer, no que você precisa pagar?
Dinheiro só não traz felicidade para quem não tem mais tempo. Porque, se você tem tempo, se você não esperar por reembolso, você pode fazer o que quiser, pode fazer tudo de novo.
Acabo de perder 20 minutos do tempo que não tinha, do sono que não dormi. E não resolvi a questão, ou você está mais aliviado depois de saber que não adianta o esforço que está fazendo porque a recompensa, se não chegou até este momento, não virá?
Quando você é criança, seu maior medo é que o Papai Noel não traga o que pediu. Quando chega na adolescência, seu maior medo é que você não seja o que pensa que é. E na idade adulta, seu maior medo é descobrir que o problema não é que não existe o Papai Noel e nem que você não é quem você acha que era: seu maior medo é descobrir que você perdeu a capacidade de acreditar. Ou seja, pode até existir o Papai Noel e você pode ser melhor do que imaginava, que de nada vai adiantar.
Que droga, não é? É.
Mas não pense que eu descobri o segredo, que eu tenho a jipe 4X4 que irá te tirar desse atoleiro. Afinal, se eu estou tendo que passar por esse aprendizado, você também terá. Qual a resposta então?
Não sei. Mas começa com bom humor. Como naquela história Zen, do mestre que continuava a chupar o canudo, mesmo depois de ter acabado toda a água do côco. Seu discípulo, pensando que ele enlouquecera, disse: “Mestre, o que você está chupando, não tem mais nada!”. E ele, sorrindo, respondeu: “É exatamente isso que eu quero, sugar todo o nada que sobrou”.
Vai entender.
O melhor ainda está para acontecer. Ou não. Você é que sabe.

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